sábado, 13 de setembro de 2014

O caso João Donati e a hipocrisia política e social

Essa semana virou notícia a morte de João Donati. Entre o público homossexual e favorável aos direitos humanos a sua morte ganhou repercussão devidas circunstâncias de seu assassinato ter claramente como motivação a sua homossexualidade. A militância acusou em redes sociais todos aqueles adeptos do discursos de ódio e que procura relativizar, minimizar ou até mesmo negar a existência da homofobia, pelo contrário, afirmar existir uma busca de privilégios por parte dos homossexuais.


 
Os dias passaram e as informações antes noticiadas foram retificadas, sendo assim inverdade que houve bilhete com mensagem de ódio na boca de João ou que as suas pernas foram quebradas. Por fim, na sexta-feira a Polícia Civil de Goiás chegou ao acusado do crime, um rapaz de 20 anos, trabalhador braçal em uma fazenda de tomates da zona rural de Inhumas, cidade na qual João morava e foi morto. Andrié Maicon Ferreira da Silva afirmou ter estrangulado o garoto devido um desentendimento ocorrido entre os dois após transarem e negou ser homossexual.
 
Para os homofóbicos de plantão foi o mote para se esquivar das acusações de incentivo a discriminação e violência. Ainda por cima foi mote também para afirmar que as mortes causadas aos homossexuais partem dos próprios homossexuais. Sendo assim muitas pessoas acataram essa hipótese, mesmo os homossexuais. Porém está errado! João Donati desde as primeiras informações até as que se tem até então continua sendo uma vítima da homofobia, que alguns insistem em relativizar, dizer que não mata e ou que não existe.
 
Um homem que de livre iniciativa e vontade faz sexo com uma pessoa do mesmo e que nega ser homossexual para a sociedade é claramente um homofóbico. Some-se a isso o fato de Andrié ser um trabalhador braçal em uma fazenda, o que pressupõe um grau de instrução mais baixo. Ou seja, é uma mistura que todos já conhecimentos, desconhecimento e negação sobre a sexualidade, resultado de uma sociedade preconceituosa e na qual instituições, entre elas a Escola, são impedidas ou simplesmente não tratam porque o discurso reacionário entende isso como algo prejudicial.
 
É hipócrita a sociedade pensar que João Donati não seja uma vítima da homofobia, dada as essas circunstâncias. Porém, hipocrisia em hora alguma maior do que a do Governo Federal, que propõe federalizar o crime. É verdade existir um conservadorismo da Polícia Civil de Goiás, justo ela que tem em seu quadro talvez a primeira delega transexual do Brasil, ao negar que a hipótese de homofobia está portanto descartada havendo quiçá uma investigação mais profunda e moralmente isenta por parte da Polícia Federal.
 
No entanto, quando a atual ministra de direitos humanos, Ideli Salvati, vem a público fazer tal proposta, federalizar a investigação do crime,  é visível o desespero da campanha eleitoral de Dilma. Digo isso porque durante os seus quase quatro anos de governo, ela retrocedeu em medidas favoráveis aos direitos civis e às políticas públicas para homossexuais. Agora, diante da apatia do voto desse público, tenta ganhar dele a simpatia, se diferenciar de sua maior ameaça, Marina Silva, e ganhar mais votos. Contudo, neste aspecto, LGBT, Marina Silva é tão igual e desprezível quanto Dilma e sua equipe de governo.
 
Portanto, o interesse altruísta em resolver o crime que matou João Donati e que irá matar e violentar de diversas outras maneiras outros homossexuais pelo Brasil, é tão verdadeiro quanto de nada homofóbico tem as motivações de seu crime.
 
 
 

sábado, 30 de agosto de 2014

Pró-família, algo que ensinei aos meus alunos a não serem.

Pró-família é como se rotulam as pessoas favoráveis a existência do casamento entre homens e mulheres e dos filhos que nascem dessa união. Eles entendem que esse modelo está sob risco e que deve ser protegido pelo Estado e pelas políticas públicas, pois a implosão desse modelo destruiria toda a sociedade. Por isso, em muitos púlpitos de igrejas, em muitas bancadas políticas e em muitos programas jornalísticos, de baixo nível crítico há de se convir, existem religiosos, políticos e comunicadores se denominando pró-família.


Outro dia durante a aula meus alunos do Ensino Fundamental diziam que quando crescessem votariam apenas em políticos pró-família. A grande questão e que eles até então não entendiam é que boa parte deles vem de modelos familiares que fogem ao modelo pregado por tais tipos de políticos. Sabendo disso esse foi aquele momento que um professor sensibilizado resolve jogar o conteúdo da aula e o seu planejamento para escanteio e focar em algo mais próximo e relevante naquele momento para os seus estudantes.

Perguntei a todos como eram as famílias deles. Muitos viviam com os pais e os irmãos, a família nuclear defendida pelos pró-família. Porém, igualmente muitos eram filhos de mães solteiras, divorciadas, possuíam os pais vivendo em um segundo casamento adotando como irmãos os filhos do novo companheiro de seu genitor. Outros eram criados pelos avós ou tios.

Perguntei a todos se eles se sentiam pessoas amadas, protegidas e de bem por serem criadas por essas famílias. Também se pensavam se tivesse em um outro tipo de família poderiam se tornar pessoas melhores ou se os seus problemas familiares seriam resolvidos. Muitos me responderam que sim, eram amados, protegidos e bem criados. Do mesmo modo que disseram que se mudassem o jeito da família e apenas isso, continuariam os problemas continuariam, como um pai alcoólatra ou a rixa com o irmão. O interessante é que problemas familiares era algo compartilhado por todos, até mesmo pelos filhos de famílias nucleares.

Bem, provocada a reflexão disse a todos que os políticos que se denominam pró-família entendem que o único modelo de família que vale é o nuclear, após é claro explicar a eles o que significa isso. Continuei dizendo que na visão desses políticos outras famílias do tipo que eles defendem, além de não serem famílias causavam problemas a toda sociedade, pois criavam pessoas sem referenciais. Todos ficaram revoltados e concluíram que Pastor Everaldo entre outros não devem ter lugar na política e em lugar algum.

Fato é que gostei do resultado da aula. Os estudantes, todos eles, evoluíram ao mesmo ponto e sem pensar que devem pensar daquele jeito porque devem. Chegaram aquela conclusão porque entendiam o que acontecia, o que estava sendo proposto e suas eventuais consequências e com seus julgamentos internos decidiram se aquilo era o que convinha a eles ou não.

O acontecimento dessa aula me inspirou. Tanto é que a aproveitei esse assunto para as aulas de Ensino Religioso. Aulas nas quais eu discuto questões cotidianas e referentes a valores, o que causa uma frustração em alguns alunos, pois eles pensam que eu vou falar de Deus e convencê-los da existência dele. Não faço nada disso e o pânico maior em alguns é quando eu admito a eles o meu ceticismo, apesar dos valores que defendo, algo que até então a noção de mundo deles entendia como incompatível.

Mas enfim, nas aulas ER a sensação de dever cumprido foi ainda maior. Primeiro porque os estudantes para os quais leciono a disciplina são da Educação de Jovens e Adultos, além de votarem em muitos casos são pais ou mães de família, são ativos em suas denominações religiosas, entre outros aspectos. O que mais gostei é a mudança de percepção que muitos foram demonstrando, inclusive os mais religiosos e militantes de suas crenças. No decorrer de 50 minutos começarem convictos de uma verdade e ao final perceberem que aquela era tão somente uma possibilidade. O melhor é que certamente desses dias pra frente muita gente não será mais pró-família.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Toda mulher precisa de um homem... gay



Todo homem gay possui pelo menos uma amiga heterossexual. É muito provável que dado o convívio esse homem gay seja o homem a vida dela. Mesmo que ela seja casada ou tenha um namorado, o amigo gay é pelo menos o amante dela. Um amante que não faz sexo, mas que às vezes bem que ela queria que fizesse. 

Sim, é verdade que ela deseja um macho heterossexual que tenha um pinto grande e gostoso que coma a xoxota molhada dela. O jeito como ele come depende. Pode ser um homem das cavernas bruto e que lhe chame de vagabunda ou um lorde inglês, que a desbrave as costas com a barba e termine com uma língua quente em sua vagina. O importante mesmo é que ela tenha prazer e obviamente seja consentido e na relação ela seja vista da mesma maneira. 

No entanto vamos convir, você é o surto de masculinidade (ou não) na vida dela. É o corpinho sarado ou simplesmente másculo no qual ela pode na balada passar suas mãos delicadas de unhas bem pintadas. É o macho que circula com ela pelos corredores do shopping e entende dos seus assuntos prediletos, às fofocas de artista, maquiagens, cabelos e roupas (tirando a moda masculina, todo o resto não se aplica a mim e elas se irritam com isso). 

Sim, você também é o homem que a noite, quando todos estão bêbado ela deita em seu ombro e começa a falar daquele macho alfa que desprezou o coração dela. Coração? O que importa o coração! Ela confessa, o que queria mesmo era aquele corpo nu e aquele falo duro e quente penetrando compulsivamente a xoxota molhada dela. E ela te confessa isso e você se excita imaginando aquilo, o pinto duro e quente é lógico. 

Você é aquele sujeito que simplesmente ela vai apresentar às melhores amigas. Também aos pais e com orgulho. A mãe vai curtir, o pai desconfiar e você querer encostar a cabeça no ombro dela para contemplar seu irmão sem camisa lavando o carro. Você é aquele sujeito de quem ela vai falar para o boy que ela começou a conhecer para ver o quão fofo ou boçal ele pode ser com a diversidade. 

O novo boy pode até desprezá-la, mas você vai levá-la para a melhor balada de música da cidade, fazê-la-ia descer até o chão e a cercará com outros homens como você, gays. E ao som de muita música Pop farão suas redes sociais bombar com fotos da noite na qual ela dança, se descabela e sorri porque é a mulher mais linda, gostosa, feliz e com tantos maridos, gays, enquanto aquele cafajeste deve estar em casa se consolando com punhetas. 

E não importa aquela invejosa do trabalho na confraternização na chácara alugada pela firma. Quando a mocreia alfinetar sua heterossexual de estimação você se transformará no "O cara que samba na cara daquela mocreia! O cara que lacra na cara das recalcadas pra te por lá em cima". Sim, porque você é ácido, irônico, Phyno, ou melhor, fino, e que mulher ganha de um gay nisso?

Sim, é você esse cara, e ela vai te desejar nu em outra noite de bebedeira e dor de cotovelo. Você até permitirá uma casquinha na sua coxa peluda, no seu umbigo ou no volume da sua calça jeans. Mas nada vai rolar. Ela juntará as amigas e juntas elas farão um fã clube para falar o quanto de culto, educado, romântico, inteligente, ácido, seguro, moderno, cheiroso e lindo você é, porém... elas entorna um shot de tequila e convergem... gay.


segunda-feira, 28 de julho de 2014

O dia do teste de HIV

Sou do tipo de pessoa falha, dessas que fez algumas vezes sexo sem utilizar camisinha. Nem vou justificar o porquê, não existe nenhuma razão para isso. Eu sempre soube o risco ao qual eu e meus parceiros estávamos correndo. Do mesmo modo que sempre me foi acessível a segurança das minhas transas casuais. Mesmo assim a gente arrisca, inconsequentemente e pensando no momento. E quanto ao risco de saber se fui contaminado, por mais indesejado que isso fosse, nunca dei muita importância. Razão para isso é que o risco de uma doença sexualmente transmissível nunca foi tão grande, no meu julgamento irresponsável, uma vez que abrir mão de preservativo comigo sempre foi eventualidades e meus parceiros em principio pudessem estar "limpinhos". 
O tempo passou e informações foram chegando a mim, informações do tipo pessoas que iam àquela balada e que morreram em decorrência da AIDS, o aumento das contaminações com o vírus no Brasil em tempos que ao redor do mundo as mesmas estão caindo, as possíveis curas se mostrarem frustradas, como é o caso do bebê do Mississipi. Depois um avião com vários cientistas da área que cai e mata todos.

No começo o que era pequenos pensamentos vão ganhando proporcionalidade. Aqueles pensamentos do tipo eu fiz e nada aconteceu vão virando eu fiz e não tenho certeza. Eu fiz, mas pode existir um risco. Os riscos estão cada vez maiores, principalmente no grupo social do qual eu faço parte. O HIV não tem cara e eu não sei a verdade...

Enfim, pensamentos que no decorrer de uns meses foram tomando a paz dos meus sonos, me fazendo sentir alguém talvez sujo, mas sem ter certeza. Olhar um rapaz na balada e pensar que talvez o não merecesse, pois eu podia estar contaminado, não saber, e por mais que utilizássemos preservativo ele tinha o direito de saber a verdade sobre mim (ou não?).

Pensei na possibilidade de fazer o teste de HIV, podia dar negativo é verdade, mas e se desse positivo? Eu não estava pronto para digerir essa possibilidade e de verdade ainda não estou. Como levaria tal notícia aos meus pais? Minha mãe principalmente, super protetora e emocional para com o mundo e principalmente para com o único filho que ela tem e do qual ela ainda está digerindo a homossexualidade. Os amigos, quem sobraria como meus amigos depois disso? Os parceiros sexuais com os quais tive contato sem camisinha, o que eles fariam quando eu contasse a eles? Deveriam ficar sabendo? Que novos comportamentos afetivos, sexuais eu teria que tomar dali pra frente?

Enfim, a cada noite, semanas após semanas, a vontade de saber minha sorologia ia de maneira angustiante tomando o meu sono. Mas na mesma proporção a minha covardia ia me impedindo de conhecer a verdade, consolando a mim na minha ignorância sobre o meu eventual risco de estar contaminado e assim, por isso aos poucos ir morrendo comprometendo minha saúde.

Compartilhei o medo com alguns dos meus amigos e todos incentivaram fazer o teste, a despeito da minha coragem, ou falta dela. Mas tudo bem, dia do Brasil e Alemanha, véspera de inaugurar este blog, vou ao CTA da minha cidade. Exame só no dia seguinte, aquele era dia de jogo e o Brasil costuma não funcionar no dia de jogo. Preencho a ficha para voltar no outro dia, mas eu não voltei porque o meu medo me impedia de voltar a um lugar em que minha cabeça pende o olhar para o chão, o ar é frio, é escuro, apesar das lampadas florescente, e que muitos dali são contaminados ou eventuais contaminados.

Passa-se o tempo... não dá para ficar calmo.... chega ao ponto que definitivamente eu não tenho mais sono. Nem coragem de compartilhar outra vez com as pessoas sobre a minha covardia.  Chegou uma terça-feira, sem dormir direito, sem comer direito, entro no bate-papo e encontro um rapaz soropositivo. Entrei justamente para isso. Começo a conversar com ele como seu eventual parceiro sexual, embora me desse medo até mesmo pensar nele nu. E é interessante como as mentalidades mudam. Noto que ele parte do pressuposto que todos os que vem conversar com ele também são soropositivos quando ele me pergunta a quanto tempo eu estou contaminado.

Sinto uma grande vergonha de mim, uma vez que não sou nada disso do que ele está pensando. Falo a verdade, eu não sei minha sorologia e estou apavorado com a minha dúvida e com o medo de descobrir a verdade. Pensei que ele pudesse ser hóstil ou magoado com isso, mas não. Sou materialista, não acredito nisso, mas se eu acreditasse, ele foi um anjo enviado pelo destino para iluminar com uma lamparina a escuridão da minha imensa dúvida. Obviamente, todas as horas que conversamos juntos não foram suficientes para trazer a plenitude da minha paz de espírito. No entanto, foi mais tranquilizante, ou apavorante, vê-lo na webcam e perceber que ele tem cara de gente como a gente. Trabalha, estuda, paga o financiamento do seu 0 Km, porém, tem uma rotina e uma consciência as quais me assusta saber que também podem ser pertinentes a mim.

Tudo bem, o dia amanhece, ouço meus pais saindo para o trabalho, o que me deixa mais apavorado. Tento dormir até que lá para as 9:00 hs eu consigo sair da cama, depois de não dormir. E me sentindo doente consigo comer alguma coisa, tomar banho, me vestir e ir ao ao CTA. Chego lá e falo da minha condição psicológica, do meu medo dominante. O teste rápido só a tarde, pela manhã só teste completo, cujo resultado é para dali 15 dias. Faço o teste completo, justifico a todos que consigo esperar por 15 dias, mas a grande verdade é que a minha coragem era o medo de voltar a tarde e descobrir ali se minha vida mudaria.

Volto pra casa, tento cochilar, tento comer, tento assistir Grey's Anatomy (7ª Temporada quando a Meredith Grey vive o dilema de fazer o teste e saber se o gene do Alzheimer de sua mãe pode ser passado ao seu futuro filho). Não dá! aquele alarme que a evolução coloca em nossa organismo, o medo, continua dominando. Mãos geladas, coração rápido. Evolução que inventou um vírus que ninguém consegue destruir.

E assim volto ao CTA, dirigindo no longo e estressante trânsito do final do horário de almoço, errando marchas e esquecendo por instantes o caminho. Chegando lá o clima é outro, não sei se melhor ou pior. Existem muito mais pessoas buscando o mesmo que eu, testes para HIV. Muitas dessas pessoas são como eu. Começo a jogar como forma de distrair. Não adianta, o coração vai disparando, disparando, a voz sumindo, as mãos vão tremendo, as pessoas vão notando o meu nervosismo. Converso com uma moça, também cara de gente como a gente, que vai saber seu resultado nos próximo minutos e dizendo para eu ficar calmo, pois ela teve um parceiro que morreu em decorrência da AIDS e eu só tinha um Se na vida.

Chega o momento que eu sento no chão e começo então a hiperventilar, as pessoas perguntam se eu quero água, se eu quero um médico e meu deus, eu estou caído, inerte e passando mal. Mãos vão dobrando, nada me obedece, entro na assistência social empurrando a mim mesmo, as pessoas, pisando em ovos pedem que eu fique calmo e respiro. Não aguento e choro, nunca na minha vida senti tanto pavor.

Consigo a guia para fazer o teste rápido. O sistema da prefeitura caí e espero horas pelo que deveria ser rápido. E ligam perguntando a atendente sobre o resultado de teste de carga viral... é impressionante como nesta hora não tem nada que abduza a gente daquele contexto.

Passa-se o tempo e a finalmente vou fazer o teste, furam o meu dedo, colocam o meu sangue no material de medição. Pedem para eu ir esperar, pois podem precisar de mim outra vez. Uma expressão clara de pisar em ovos. Só precisam outra vez dos pacientes aqueles nos quais o primeiro teste deu positivo. O tempo passa, e a bichinha cabeleira atende o telefone dizendo à amiga onde está, no posto de saúde fazendo inalação devido o tempo. Olha para mim que presto atenção na conversa inocentemente e eu olho para o teto com vergonha e olho as horas e me levanto, olho a avenida lá fora, o sol das quase 5 horas e a biomédica grita o meu nome e pede que eu vá até à Assistência Social. Deu tudo certo?

Chego até lá, a assistente imprime o exame, entrega a enfermeira e me leva a sua sala, aquela onde tem cartazes com foto das DST nos órgãos genitais. Ela faz algumas considerações e diz, seu exame deu Negativo. É brega falar isso, mas achei o branco daquele consultório muito bonito e a luz do sol que entrava pela janela e que batia nos fios da enfermeira. Vou embora, feliz, alegre por saber exatamente onde está o ponto da embreagem e as marchas do carro.

A noite no Skype encontro o menino positivo. Ele me pergunta sobre o exame e eu digo. Ele pergunta se eu abracei minha mãe, o meu cachorro e me dá uma bronca, para que nunca mais eu me coloque em tal situação. Sinceramente, o achei tão lindinho e até quis dizer isso a ele, mas minha coragem foi apenas a de sugerir um dia para dividirmos um balde de Heineken (dirigir os nossos carros de volta pra casa, sujeito a um teste do bafômetro, o que seria sorte diante da possibilidade uma colisão e de machucar alguém ou a nós mesmo).

Didático foi? Com toda certeza, tanto medo, tanto sono perdido, tanta coisas que vivenciei meu trouxe mais responsabilidades. Vergonha de tudo o que passei não sinto, aliás, penso que nem faz sentido sentir vergonha. Porém, ainda assim foi traumático e do mesmo modo que não consigo pensar em sexo, pensar nele sem camisinha me dá uma sensação semelhante a de pensar na morte.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Homossexuais não devem votar em Dilma Rousseff

Há quatro anos aconteceu a última eleição presidencial no Brasil. Na época eu estava aqui na blogosfera com outro nome e em outro lugar. Escrevi com otimismo sobre a eleição de Dilma Rousseff. Eu a via com esperança e uma consolidação das lentas e iniciantes políticas públicas para homossexuais e transgêneros no Brasil, iniciadas pelo presidente Lula. 

Dilma Rousseff foi eleita em um segundo turno, quando era favorita para vencer ainda no primeiro devida a popularidade de seu antecessor, Lula. Alguns analistas políticos da época, sobretudo dos blogs e sites de notícias autoproclamados independentes, atribuíram a perda de fôlego da presidenciável à rejeição dos conservadores em relação a presidente. Surgiram na época correntes por email acusando Dilma de patrocinadora de abortos e em menor caso do casamento gay. Para um público religioso cristão e fundamentalista aberrações, males maiores a serem combatidos. 

O maior concorrente de Dilma, José Serra, soube aproveitar bastante dessa discussão (pobre e ridícula). Tanto é que durante a sua campanha viu-se muitas visitas dele aos templos e eventos religiosos, principalmente das igrejas evangélicas pentecostais. Mas sendo o Brasil um país majoritariamente católico, ele não se esqueceu de visitar Aparecida do Norte - SP e com sua candidata a 1ª dama posar ao lado da imagem da santa padroeira do país. O melhor retrato de bom moço que vai à missa. Durante suas peças publicitárias, nada melhor do que a sutil mensagem de se afirmar que José Serra é do bem, e o melhor de tudo, com várias mulheres em avançadas semanas de gestação (dando a ideia: Dilma é aquela pessoa que é contra isso?).



Obviamente a equipe de campanha de Dilma Rousseff reagiu aquela escalada de conservadorismo no debate político. Pautas todas elas pobres, diga-se de passagem, e às quais  José Serra recorreu na falta de argumentos e melhor convencimento junto a população de ser um bom presidente. A solução portanto foi uma reunião com líderes de grandes denominações religiosas e a assinatura de uma tal carta de Dilma ao povo de Deus na qual ela se prontifica a não se envolver em temas considerados sensíveis por esse segmento. A carta pode ser encontrada fazendo se pesquisa em sites de busca.

Tudo bem! Ainda assim confiei na presidenciável, até mesmo porque para mim não estava claro o teor da tal carta. Me pareceu mais com um "deixa disso, companheiros" do que um compromisso claro e firmado com os conservadores. Até mesmo porque cumprir rigorosamente algum compromisso de campanha nunca foi um forte da política brasileira, nem mesmo do Partido dos Trabalhadores, legenda pela qual sempre tive uma predileção.

Dilma Rousseff foi eleita presidente e começou o seu governo. A fama de dama de ferro foi aos poucos se consolidando, já que a mesma tratava de cortar os ministros acusados de corrupão pela Imprensa. Porém com o ministro Antônio Palocci a coisa desandou. Ele que também foi ministro no primeiro governo do presidente Lula e foi retirado devido as constantes denuncias de envolvimento com o mensalão estava novamente no Governo. Outra vez a Imprensa caiu matando com novas denúncias e a oposição ao governo no Congresso Nacional ameaçou com a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI. 

A Bancada Evangélica, que no caso brasileiro une políticos de vários partidos políticos, aproveitou a oportunidade para chantagear a Presidente Dilma ao proporem o cancelamento do programa Escola Sem Homofobia ou a abertura de uma CPI contra o ministro. A presidente Dilma Rousseff aceitou a negociação, cancelou o programa o de maneira unilateral, sem ouvir as pessoas que o elaboraram, muito menos as pessoas a quem ele representa e ou apoia. Porém, de nada adiantou o ministro Antônio Palocci caiu semanas depois devido a intensificação das denúncias.

Esse evento certamente foi o mais emblemático, pois demonstrou que os homossexuais e os transgêneros, grupos que historicamente sempre estiveram nas pautas do Partido dos Trabalhadores e por ele militaram, foram colocados de lado. Além disso, nas declarações dadas pela presidente Dilma naquele episódio pôde se ver o grau de conhecimento e interesse da mesma tanto para com o projeto Escola Sem Homofobia, quanto para a pauta de reivindicações e as características do grupo social LGBT. Ela afirmou que não era função do governo "fazer propaganda" de "opções sexuais".




Apesar do impacto, do grande balde de água fria, que foi a suspensão unilateral do Escola Sem Homofobia, este evento ainda não foi o único para descrever que com Dilma e o PT governista, o propósito maior tornou-se se manter no poder, ainda que isto signifique postergar ou mesmo abandonar históricas reivindicações pelas quais o partido lutou e cresceu. Tanto o PT como a presidente Dilma, até então pintada por seus apoiadores como uma mulher de pulso forte, destemida e decidida, se mostraram assustado com o poder da bancada evangélica nas campanhas eleitorais e nas votações dos projetos propostos pelo Governo no Congresso Nacional.

Sendo assim, o Projeto de Lei da Câmara Número 122 de 2006, tornou-se o próximo alvo da Intifada promovida pela Bancada Evangélica contra os homossexuais e transgêneros.  Por esta razão, a Senadora Marta Suplicy do PT de São Paulo, propôs escrever um novo projeto de lei em parceria com os sabidamente conservadores senadores Magno Malta (PRB - ES) e Demóstenes Torres (DEM - GO), porém visivelmente mais pobre, brando e limitado às questões trabalhistas. Motivo? Oficialmente a de que o PLC 122/06 foi redigido unilateralmente para dar privilégios aos gays e eles, os evangélicos, estavam sendo excluídos do debate. Papo furado, obviamente! Mas para a Presidente Dilma o intuito principal era se afastar da imagem de megera dos homossexuais e transgêneros, porém sem causar a ira dos evangélicos.

Eventos mais pontuais foram se seguindo no decorrer do governo de Dilma Rousseff. Polêmicas envolvendo injustiças de desumanidades contra os homossexuais e transgêneros foram sempre noticiadas, algumas vezes com notoriedade na Grande Imprensa. O Governo por sua vez preferiu manter-se calado. Jamais acionou os ministros da Justiça ou de Direitos Humanos, no caso a ministra Maria do Rosário, um dos poucos surtos de bom senso por parte de Rousseff no tema, mas ainda assim inútil devido os engessamentos que seus propósitos governistas impuseram à Rosário.

Outros desses eventos foram propagandas de conscientização sobre DST/AIDS destinadas aos homossexuais e que foram canceladas pelo Governo por este entender serem polêmicas. Do mesmo modo pequenas medidas foram esquecidas, como o INSS ou a Receita Federal aceitarem como dependentes os companheiros de casais homossexuais, assim como a aceitação do nome social dos transgêneros em órgãos públicos federais. 

Em 2013  outra vez o PT demonstrou a suas prioridades ao deixar a Comissão de Direitos Humanos e Minorias do para o Partido Social Cristão presidir. Isso deu abertura ao deputado Marco Feliciano, reconhecido nas redes sociais por seus vídeos e declarações nas quais ele abusa do desespero e boa fé das pessoas, bem como justifica atrocidades às minorias com base em suas concepções religiosas. Durante o período em que esteve na CDHM, Marco Feliciano além de rejeitado pelas pessoas que sempre precisaram dessa comissão para ganhar alguma notoriedade, respeito e avançar em cidadania, mostrou-se fechado a ouvir as críticas e preocupado em aprovar projetos contrários ao que esses grupos precisam, como o projeto de cura da gay.

Resumidamente para nós homossexuais os últimos 4 anos foram perdidos no que diz respeito ao Congresso Nacional (este se mostrou extremamente ultrapassado, burro, insolente, insensível e inútil) e à Presidência da República, no caso a Presidente Dilma Rousseff. Ela e seu governo nada de relevante fizeram por nós homossexuais e transgêneros, mas pode esperar, nesta campanha eleitoral seus militantes, membros de seu governo ou ela própria podem aparecer, ainda que timidamente pedindo o nosso voto de minoria. Os únicos avanços significativos foram dado pelo Judiciário, votações unânimes em prol da União e do Casamento Civil para homossexuais por parte dos Supremos Tribunais Federais e de Justiça, além da determinação por parte do Conselho Nacional de Justiça para que todos os cartórios do Brasil casem os casais homossexuais.

Sei que é muito pobre limitar as atitudes de qualquer político a uma única pauta, por mais relevante que ela seja como é o caso dos direitos humanos. É preciso avaliar também outras coisas, desenvolvimento social, melhorias dos serviços públicos, elaboração de políticas públicas referentes aos diferentes assuntos, enfim. Também é verdade minha rejeição a outros candidatos, plena no caso de Aécio Neves, que provavelmente vai se apoiar novamente no voto conservador para tentar se eleger. Falar que eu não votaria outra vez em Dilma Rousseff atualmente é uma incógnita, muito provavelmente não se existir exclusivamente um primeiro turno.

No entanto é preponderante que nós homossexuais e transgêneros, assim como os ruralistas, os evangélicos, os trabalhadores rurais, os empresários, enfim, nos organizemos como um grupo coeso e demonstre nas eleições, principalmente nas presidenciais com quem estamos ou queremos longe, bem como as razões para isso. Somos pelos menos 13 milhões de brasileiros, somos pelo menos 13 milhões de eleitores e precisamos mostrar à sociedade e à política a seguinte indagação: 

QUEM ESTÁ DISPOSTO A JOGAR FORA O APOIO DE 13 MILHÕES DE VOTOS?!

quarta-feira, 9 de julho de 2014

O que realmente dá vergonha de ser brasileiro

Certamente é impossível que exista um brasileiro que não tenha visto ou saiba da nossa histórica e colossal derrota para a Alemanha por 7x1, evento que mexeu com todos nós. Nas redes sociais, por onde habitam gente como a gente, borbulharam comentários sobre o partida de futebol ocorrida no Mineirão. A maioria tendo como viés o humor, um jeito mais fácil de levar aquela humilhante derrota. Outras tendo como viés a crítica, muitas vezes feroz e revoltosa à atuação do futebol brasileiro, como se esta fosse a maior das nossas prioridades, ou mesmo uma prioridade. Em outros casos, críticas sociais mesmo ao Brasil e como se depois de 90 minutos nos lembrássemos que não estamos bem.

Uma manifestação de revolta me chamou mais a atenção. Foi publicada no Facebook por aquele delicinha do Nelson Carneiro (SuperPride e Põe Na Roda).  Lógico que ele fez isso para dizer que não concordava. Own, além de lindinho é inteligente. Mas vamos ao X da questão. 

Tudo bem, eu também não sou um cara nacionalista e de verdade se alguém me chamar assim estará me xingando. No entanto tenho bem claro comigo que é necessário existir um sentimento de nação no povo brasileiro, algo que supere eventos esportivos, principalmente a Copa do Mundo, e transborde para as outras questões, principalmente à nossa política e as coisas que decorrem dela.

É verdade, a derrota da Seleção Brasileira foi humilhante. Lendo algumas críticas de especialistas (especialista de verdade) em futebol uma coisa é possível concluir, a derrota do Brasil é uma consequência de problemas que superam o técnico escolhido, bem como a escalação e as táticas que ele estabeleceu. Sem querer ir muito além, resumidamente falta profissionalização do futebol brasileiro e sobra a crença que raça e paixão vai trazer a vitória, o Hexa. 

Porém nada me causa maior vergonha e baixa autoestima do que esse grupo de "compatriotas" queimando a nossa bandeira. Como assim? Aquele pano com figuras geométricas em verde, amarelo e azul representam todo um povo, história, valores e atributos e daí, porque uma empresa privada, que tão somente nos representa em um evento esportivo, perde a competição, um grupo de zés ruelas pode se achar no direito de por fogo no que representa um grupo de pessoas do qual elas também fazem parte e o lugar onde elas vivem. É como se tudo isso, futebol e nação brasileira, fosse uma coisa só ou como se bandeira representasse e apenas isso, o futebol.

Tal ato é uma exemplificação do imaginário que habita a mente de muitos brasileiros, que agora estão por aí esbravejando nas quilométricas filas do Bradesco, pontos de ônibus, padarias de esquinas ou mesmo nas redes sociais a vergonha de ser brasileiro porque o Brasil perdeu. É gente que às vezes vai fundamentar sua vergonha também nos nossos problemáticos serviços públicos, infraestrutura, crescimento econômico e política.
Mas tudo isso é bastante hipócrita, essas pessoas não possuem o direito de se sentirem envergonhadas. Na política, elas sequer se lembram em que votaram há dois anos. Nos serviços públicos, muitas sempre reclamaram e acham arruaceiros quem chegou a um ponto máximo de revolta que resolve protestar nas ruas. Enfim, são pessoas que nunca fizeram nada efetivamente para solucionar o que possa ser considerado realmente problema do nosso país. 

Sendo assim, é uma pena, uma hipocrisia e uma vergonha que o patriotismo brasileiro se limite em regra a Copa e ao resultado que a Seleção Brasileira obtenha na mesma.