Pró-família é como se rotulam as pessoas favoráveis
a existência do casamento entre homens e mulheres e dos filhos que nascem dessa
união. Eles entendem que esse modelo está sob risco e que deve ser protegido
pelo Estado e pelas políticas públicas, pois a implosão desse modelo destruiria
toda a sociedade. Por isso, em muitos púlpitos de igrejas, em muitas bancadas
políticas e em muitos programas jornalísticos, de baixo nível crítico há de se
convir, existem religiosos, políticos e comunicadores se denominando
pró-família.
Outro dia durante a aula meus alunos do Ensino
Fundamental diziam que quando crescessem votariam apenas em políticos
pró-família. A grande questão e que eles até então não entendiam é que boa
parte deles vem de modelos familiares que fogem ao modelo pregado por tais
tipos de políticos. Sabendo disso esse foi aquele momento que um professor
sensibilizado resolve jogar o conteúdo da aula e o seu planejamento para escanteio
e focar em algo mais próximo e relevante naquele momento para os seus
estudantes.
Perguntei a todos como eram as famílias deles.
Muitos viviam com os pais e os irmãos, a família nuclear defendida pelos
pró-família. Porém, igualmente muitos eram filhos de mães solteiras,
divorciadas, possuíam os pais vivendo em um segundo casamento adotando como
irmãos os filhos do novo companheiro de seu genitor. Outros eram criados pelos
avós ou tios.
Perguntei a todos se eles se sentiam pessoas
amadas, protegidas e de bem por serem criadas por essas famílias. Também se
pensavam se tivesse em um outro tipo de família poderiam se tornar pessoas
melhores ou se os seus problemas familiares seriam resolvidos. Muitos me
responderam que sim, eram amados, protegidos e bem criados. Do mesmo modo que
disseram que se mudassem o jeito da família e apenas isso, continuariam os problemas continuariam, como um pai alcoólatra ou a rixa com o irmão. O interessante é que
problemas familiares era algo compartilhado por todos, até mesmo pelos filhos
de famílias nucleares.
Bem, provocada a reflexão disse a todos que os
políticos que se denominam pró-família entendem que o único modelo de família
que vale é o nuclear, após é claro explicar a eles o que significa isso. Continuei
dizendo que na visão desses políticos outras famílias do tipo que eles
defendem, além de não serem famílias causavam problemas a toda sociedade, pois
criavam pessoas sem referenciais. Todos ficaram revoltados e concluíram que
Pastor Everaldo entre outros não devem ter lugar na política e em lugar algum.
Fato é que gostei do resultado da aula. Os
estudantes, todos eles, evoluíram ao mesmo ponto e sem pensar que devem pensar
daquele jeito porque devem. Chegaram aquela conclusão porque entendiam o que
acontecia, o que estava sendo proposto e suas eventuais consequências e com seus
julgamentos internos decidiram se aquilo era o que convinha a eles ou não.
O acontecimento dessa aula me
inspirou. Tanto é que a aproveitei esse assunto para as aulas de Ensino
Religioso. Aulas nas quais eu discuto questões cotidianas e referentes a
valores, o que causa uma frustração em alguns alunos, pois eles pensam que eu
vou falar de Deus e convencê-los da existência dele. Não faço nada disso e o
pânico maior em alguns é quando eu admito a eles o meu ceticismo, apesar dos
valores que defendo, algo que até então a noção de mundo deles entendia como
incompatível.
Mas enfim, nas aulas ER a sensação de dever cumprido foi
ainda maior. Primeiro porque os estudantes para os quais leciono a disciplina
são da Educação de Jovens e Adultos, além de votarem em muitos casos são pais ou
mães de família, são ativos em suas denominações religiosas, entre outros
aspectos. O que mais gostei é a mudança de percepção que muitos foram
demonstrando, inclusive os mais religiosos e militantes de suas crenças. No
decorrer de 50 minutos começarem convictos de uma verdade e ao final perceberem
que aquela era tão somente uma possibilidade. O melhor é que certamente desses dias pra frente muita gente não será mais pró-família.